sexta-feira, 26 de julho de 2013

Dois poemas....

Amigos da blogosfera. Estou de férias por isso blogando bastante esses dias. Para quem me diz que eu deveria "blogar mais", taí. Bloguei até receitinha culinária. Estive pensando se eu gostaria de viver de férias. Não, com certeza.
Tanto a fazer fora da internet que deixo de blogar. Embora goste sim.

Confessarei algo por aqui: gosto também daqueles dias em que não cozinho nada. Como algumas castanhas, passas, e não sinto fome. Dias cada vez mais essenciais. Percebi que fome é ponto de vista e alimento é uma questão de escolha.

Hoje blogarei o que mais gosto de blogar: poesia.

Há alguns anos um amigo mudou-se de país e se desfez de alguns de seus pertences. Livros, basicamente. Ele perguntou-me se eu queria comprar um livro do filho do Alphnosus Guimaraens, um poeta simbolista mineiro que eu nem conhecia direito naquela ocasião, conheci depois. Eu respondi que não e aí ele me deu o livro. Na época, eu não tinha noção da preciosidade poética que me caía nas mãos. Tanto que o livro ficou um tempo "mudo" e só aos poucos comecei a folheá-lo. Cada abertura de página era uma surpresa, um encanto, uma epifania. O livro é simplesmente mágico. Por meio dele ingressei no universo simbólico e místico dos Alphonsus mineiros.

Escolhi dois poemas do livro "Só a noite é que amanhece", que na realidade é uma coletânea de toda a obra poética de Alphonsus Filho, para compartilhar aqui na blogosfera e derramar um pouco de poesia ao som de Clair de Lune, do Debussy, em homenagem ao meu professor de francês que uma vez me disse que se lembra dessa música quando me vê. O que não sei se é bom ou ruim.

Encontrei no youtube uma versão interessante de Clair de Lune, em solo de piano, que vale a pena compartilhar.

De que matéria..

De que matéria me componho
que é um misto de real e sonho?

De que silêncio me alimento
que seja mais que o calar do vento?

Em que alegria vivida
banha-se a alma em si perdida?

e resplandece
se desconhece,

fonte de fonte, luz de luz
que, infinita, se reduz

a lúcido, trágico horizonte,
a não sei que solidão de monte

a água e brilho de indefinida
brasa que nunca foi desta vida..


Lâminas

Lâminas cegas, tuas mãos deslizam,
cruzam a carne da noite. Em vão recordas
não sei que vidas, ressoantes cordas
que se insinuam.

Lâminas cegas...Buscas simplesmente
rever a luz um dia pressentida
além da carne, além do sonho (a vida?)
além da própria luz.

Que isso que chamam vida não consola
nem basta, eis teu suplício. Nos desvãos
do tempo, iluminam-se os irmãos
de rostos dissipados.

Lâminas cegas, cegas! E deslizam.
E fendem a crosta mais cruel e inerte
de um silêncio que salva ou que perverte,
e nem silêncio é.

Derivas, solitário, por escuro
túnel, rompes a noite. E no rompê-la
sentes um gosto lúcido de estrela
E regressas. E partes.

Poemas de Alphonsus de Guimaraens Filho.



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